Percebe-se o incómodo de muitos militantes do PSD, que não percebem este "abraço" depois de uma campanha de críticas de Rodrigues à governação. Mas Albuquerque percebeu...
A situação política na Madeira tem contornos cada vez mais complexos. E em muitas situações, difíceis de entender em função das diferenças de discursos conforme os interesses do momento, quer estejamos em campanha, quer estejamos a digerir os resultados e fazer acordos. Em Política, a mentira de hoje pode muito bem ser a verdade de amanhã. E aquela frase feita que se cumpriu a vontade do povo, é mera retórica porque o povo pode ser enganado, como em alguns casos é, por uma falsa mensagem visando a captação de votos. Por posições que apontam para um sentido, por atitudes que depois vão em sentido contrário. Mérito de quem passa a mensagem, demérito de quem acredita no "Pai Natal". Percebem as razões que levam quase metade dos eleitores inscritos a ficarem em casa? Precisamente porque grande parte da classe política não tem palavra, não cumpre o que promete, engana com a mensagem e brinca com o voto que foi conferido mediante uma determinada conjuntura. Claro que é a Democracia a funcionar, não há nada de irregular, constitucionalmente pode ser assim. Mas enganam na mesma. Democraticamente.
E o PSD, que vem perdendo votos e deputados, ainda assim ganha por maioria relativa e é com esse posicionamento minoritário que vai governar por indigitação do Representante da República, que perante duas soluções sem garantia escrita de maioria absoluta parlamentar, de 24 deputados, não tinha outra solução lógica que não fosse convidar Miguel Albuquerque a formar Governo enquanto líder do partido que efetivamente ganhou as eleições.
E tanto o PS como o JPP foram de canivete para uma "carreira de tiro" quando apresentaram uma solução sem solução levando ao Representante uma proposta de Governo com base num apoio parlamentar de 20 deputados quando precisavam de 24. Uma "morte" certa sabendo-se que em igualdade de circunstâncias seria indigitado o líder indicado pelo partido vencedor. Como foi possível este passo em falso? Como foi possível este passo em falso de quem, como o JPP, quer crescer com sustentação para o futuro?
Mas no meio de tudo isto, há um nome que ressalta pelo protagonismo, pela inteligência e pela audácia. Um negociador nato. De um jornalista profissional competente, José Manuel Rodrigues assumiu um protagonismo político determinante para o CDS e para si próprio, mas sobretudo determinante para o PSD, que foi obrigado a negociar a presidência da Assembleia em 2019, com "sacrifício" de Tranquada Gomes, e agora é obrigado a negociar a mesma presidência da Assembleia com "sacrifício" de Cunha e Silva, que naturalmente ficou com as expectativas em baixo face a esta promessa de regresso por cima à política ativa.
A diferença é que em 2019, o CDS era decisivo, em 2023 menos mas ainda, e em 2024 muito menos mas suficiente para compor a perda de deputados do PSD, que por este acordo de incidência parlamentar, que na prática funciona como uma coligação, fica com 21 deputado e o PS e JPP com 20. Numa votação do programa de Governo, basta a abstenção dos restantes partidos. Inteligente sem dúvida. E lá está, José Manuel Rodrigues de novo decisivo neste "ioiô" ao PSD (falta saber como se sente a deputada eleita Sara Madalena, que rompeu com Rui Barreto por causa da coligação com o PSD...).
É preciso, sobretudo, reconhecer mérito a José Manuel Rodrigues nesta "arte" de fazer política. Além de se reconhecer que foi um presidente da Assembleia ativo e inovador relativamente à figura de corpo presente dos seus antecessores. Ganha facilmente a votação para novo mandato.
Percebe-se o incómodo de muitos militantes do PSD, que não percebem este "abraço" depois de uma campanha de críticas de Rodrigues à governação. Mas Albuquerque percebeu, percebeu sobretudo que esse discurso era estratégico para o CDS recuperar eleitorado e sabia perfeitamente o que oferecer para ter o apoio do CDS.
Finalmente, é preciso reconhecer, também, o mérito de Miguel Albuquerque no meio da política madeirense onde a palavra e a ética andam de certo modo nubladas. Albuquerque consegue o apoio do PSD, mas mais do que isso, consegue que a IL, o PAN e o CHEGA, que até disse "com Albuquerque, nada", dessem a conhecer ao Representante da República, como o próprio disse, a disponibilidade para colaborarem na aprovação do programa de Governo, ao qual se associa uma moção de confiança. É obra de quem pretende governar. É risco para quem aprova uma confiança, mesmo pela abstenção, e depois tem que dizer que desconfia em situações futuras.
Albuquerque tem mérito, mesmo que alguma parte seja demérito de outros. E isso tem relevo quando às maiorias relativas se juntam a relatividade das palavras.
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