"Só com muito dinheiro se consegue fazer brilhar o vazio, daí ter que ser obrigatório estar encostado aos poderes públicos".

O padre José Luís Rodrigues, pároco de São Roque, discorreu o seu pensamento pela escrita na "água", no espaço habitual do Facebook, abordando o custo elevado do altar do Papa, de 4 milhões de euros, para mais e não para menos, por ocasião das Jornadas Mundiais da Juventude, não alinhando pelos escândalos que pululam desde que o assunto foi tornado público, mas não deixando, também, de criticar a procura de "palco", muito portuguesa, através da mania das grandezas.
O padre escreve que "ao contrário da maioria não estou muito escandalizado com o valor astronómico que vai ser gasto num «papa-palco», como sinal de mais uma megalomania de um pobre país com manias de rico, em Lisboa para a celebração de uma missa, mas que depois, dizem, se converterá em palco permanente para outros eventos, abrilhantado com promessas que dali nascerão rios de retorno financeiro para o nosso país".
José Luís Rodrigues prossegue: "Não me escandalizo, mas mais uma vez fico triste, porque em qualquer parte de Portugal, toda a obra por mais singela que seja, realizada pelas entidades públicas nunca é o seu justo valor. Uma quando é por ajuste direto, outra porque derrapou e outra ainda quando à volta da obra, voam abutres esfomeados. É assim a nossa sina e não vale saltar à praça sob a capa da surpresa e com o moralismo hipócrita, tão peculiar da nossa sociedade".
Não é por acaso que o Papa se chama Francisco, lembra o "irrequieto" pároco de São Roque, conhecido pela frontalidade e abordagem de assuntos para os quais a Igreja se fecha, sobre si, a "sete chaves". Recorda o padre que Francisco "faz jus à simplicidade e pobreza de São Francisco de Assis, o modelo mais expoente do Cristianismo ocidental da radical simplicidade e pobreza. Um palco para meter duas mil pessoas sentadas, é uma loucura, uma megalomania que não serve para missa nenhuma, mas só e apenas para fazer show".
"Todos nós, católicos ou não, estamos habituados (mal habituados), a que os eventos religiosos ou não, tenham que ser impressionantemente grandes (basta lembrarmos os arraiais e celebrações natalícias). Assim, tudo deve ser grande e caro. A contento deste «pecado» esquecemos a simplicidade de Cristo, que «manda» fazermos como Ele fez.
Nos tempos que vivemos tudo tem que ser em grande, espetacular e emotivamente impressionante senão não presta. Vai daí que «missas do parto», arraiais religiosos, jornadas, congressos, peregrinações e todo o género de eventos quer sejam religiosos ou profanos se não arrebanham multidões não são úteis, são «chatos», maçadores e saturantes... Todos estamos consumidos pela mania das grandezas, mas que custam caro e, no caso de serem os cristãos, são o maior contra testemunho evangélico".
O padre José Luís, com o desassombro conhecido, acaba por deixar a "nú" alguns dos "pecados" da Igreja: "Nos tempos que vivemos, serenar e pensar, assumir desafios que comprometam, cansa, por isso, só com muito dinheiro se consegue fazer brilhar o vazio, daí ter que ser obrigatório estar encostado aos poderes públicos. Mas a mesma opinião pública que se mata pela espetacularidade dos eventos, farisaicamente, censura e faz juízos morais hipócritas, porque é caro e ai Jesus os dinheiros dos nossos impostos".
"É pena que as vaidades e as megalomanias de alguns tenham ensombrado as JMJ-2023 que, admito, pode trazer grandes benefícios para o nosso país, inclusive mais-valias financeiras. No entanto, já que se fala tanto em altares e palcos de milhões, é preciso sempre relevar que a evangelização despensa palcos sumptuosos e caros, bastarão umas pedras rasas ou umas tábuas tocas. Nestas circunstâncias, estou seguro, que o Papa Francisco apreciaria melhor presidir à missa".
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