Sem coragem política vamos ter incêndios catastróficos
- Henrique Correia
- 24 de ago. de 2024
- 3 min de leitura
"O que querem é mais gado na serra, como se as cabras e as ovelhas comessem eucaliptos".

Com Ciência e não com tradição. Esta é a "receita" do investigador Raimundo Quintal, antigo vereador da Câmara do Funchal, para o período pós incêndios. Com um aviso de quem sabe do que fala, pelos conhecimentos e pela experiência que tem: "A médio e a longo prazo, voltaremos a vivenciar novos incêndios catastróficos se não houver coragem política de alterar o coberto vegetal, especialmente entre os 300 e 800 metros de altitude, onde as espécies invasoras e pirófilas ocuparam antigos terrenos agrícolas e convivem com as habitações. A população também terá de perceber que tem obrigação de limpar os terrenos à volta das casas".
Rainundo Quintal diz que "terminado o fogo, terá de haver um longo e dispendioso trabalho de limpeza e contenção de escarpas e taludes de estradas, porque as temperaturas ultrapassaram os 1200 graus, o que determinou a fractura das rochas basálticas. Com as primeiras chuvas, os riscos de desabamentos (quebradas) e aluviões serão acrescidos".
Mas o investigador tem dúvidas sobre a vontade política: "Pelo que tenho observado tais alterações estão seriamente comprometidas. O que querem é mais gado na serra, como se as cabras e as ovelhas comessem eucaliptos, acácias, tabaqueira, carqueja ou feiteira. A Serra da Estrela tem pastoreio intensivo e arde frequentemente!
Na Madeira, o pastoreio, devidamente ordenado, poderá ser implementado, não na alta montanha ou na Laurissilva onde as espécies nativas deverão recuperar o seu espaço, mas nas altitudes intermédias, nos terrenos presentemente ocupados por eucaliptos, acácias, cana vieira, tabaqueiras, silvados e outras espécies pirófilas, após a limpeza destas.
Defendo esta estratégia há muitos anos. Com a criação do Parque Ecológico do Funchal, em 1994, foram retiradas as ovelhas e as cabras, que vagueavam desde os Tornos até ao Pico do Areeiro e foi delimitado um espaço na Ribeira das Cales para pastoreio ordenado de 250 cabeças de gado ovino".
Raimundo Quintal lembra que "a Cooperativa de Criadores de Gado do Monte assinou um protocolo com a Câmara Municipal do Funchal e durante vários anos geriu esse rebanho. Por indisponibilidade dos seus membros, os animais foram comprados pela Secretaria Regional do Ambiente e a cooperativa extinguiu a sua actividade.
Porque a mentira só vale, enquanto a verdade não chega, é importante esclarecer que alguns donos de animais (não pastores) recusaram integrar a cooperativa e insistiram no pastoreio selvagem na propriedade municipal.
Porque estavam a usar abusivamente uma vasta área vocacionada para a restauração dos ecossistemas e a educação ambiental, foram obrigados sair.
Desde então, jamais deixaram de insultar e ameaçar quem exerceu a autoridade em nome da conservação da Natureza.
Agora, com mais esta tragédia, recrudesceram os insultos, que terão a adequada resposta judicial, e as pressões à secretária regional com a tutela da agricultura e do ambiente para permitir o retorno do gado às serras, com a falaciosa argumentação de que o gado seria uma preciosa ajuda para evitar os incêndios".
"Ao Senhor Presidente do Governo Regional, à Senhora Secretária da Agricultura e Ambiente e aos líderes partidários que dão guarida a uns indivíduos que sempre se recusaram a cumprir a legislação ordenadora do regime silvopastoril, recomendo o estudo da História e da Geografia da Ilha da Madeira, bem como os excelentes documentos científicos sobre as alterações climáticas".
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