"A passividade dos madeirenses já merecia um estudo clínico..."
- Henrique Correia
- 4 de ago.
- 2 min de leitura
Manuel Martins uma voz de alerta: "Vamos dando desculpas, dizendo que é “só mais uma fase” ou “importante para a economia”. Como se houvesse economia possível num território esgotado, esventrado, irreconhecível".



Manuel Martins tem sido uma voz ouvida no universo da Igreja Madeirense, conhecido pelas divergências relativamente a assuntos preocupam muitos madeirenses, mas poucos ousam colocar o "dedo na ferida" fora de círculos restritos de circulação crítica fechada. O cónego, que lidera a Paróquia de São Martinho depois de ter passado pela Sé e por Machico, puxou do teclado para uma publicação de conteúdo crítico devido a uma atividade turística que está a asfixiar a Região enquanto as entidades procuram soluções cuja eficácia será cada vez mais difícil com o deixar correr a situação apenas com paliativos.
Manuel Martins escreve que "esta ilha da Madeira deixou de ser tua", acrescentando que "os sítios onde cresceste, onde aprendeste a ouvir o silêncio das montanhas e a respeitar o tempo das coisas, estão agora sitiados por filas de carros alugados, drones a sobrevoar cabeças, e multidões que tratam a tua terra como se fosse um cenário descartável para stories de Instagram".
Prossegue que "em dois anos, triplicaram os rent-a-car. São mais de 280 empresas. Não é mobilidade. É invasão motorizada. Substituímos rebanhos por SUVs. Substituímos o cheiro a pinho pelo fumo dos travões. A ilha virou estacionamento e miradouro panorâmico ao serviço do turista — e o madeirense que se desvie".
"Os teus espaços de lazer? Desapareceram. Tomados por filas, por lixo, por guias de excursões a gritarem em cinco línguas ao mesmo tempo. A tua paz foi vendida por meia dúzia de dormidas em alojamentos locais que, na prática, já nem locais são.
O Fanal está a morrer. Árvores endémicas com mais de mil anos estão a ser pisadas, vandalizadas, arrancadas. Continuando assim, dentro de uma dezena de anos será uma poça de lama com um placar turístico a dizer “aqui houve floresta”.
O cónego questiona: "E o que fazemos nós? Nada. A passividade dos madeirenses já merecia um estudo clínico. Entre o medo de perder rendimento e o medo de falar alto, ficamos calados enquanto a Madeira nos escorrega pelas mãos. Vamos dando desculpas, dizendo que é “só mais uma fase” ou “importante para a economia”. Como se houvesse economia possível num território esgotado, esventrado, irreconhecível.
A Madeira está a ser vendida, peça por peça, a céu aberto. E o mais grave é que ninguém parece disposto a dizer basta. As autoridades assobiam para o lado e exibem prémios conseguidos não sei como, e nada acrescentam à vida dos madeirenses. A comunicação social ignora. As empresas do setor turístico enchem os bolsos. E o povo assiste, de braços cruzados, ao saque da sua própria casa".
Sublime...