O PS foi cúmplice durante muito tempo. E só fugiu desse registo, curiosamente com Cafôfo, em 2019, numa conjuntura única, como tal irrepetível face à impossibilidade de reunir todos aqueles factores favoráveis. Esteve quase, mas não se ganham eleições com quase.

A Madeira é um caso de estudo. Um estudo sobre a própria forma de Autonomia, sobre o modo como foi construído este "edifício" democrático, as estratégias, as influências, as estruturas associativas e de classe, o contexto empresarial, até as associações de estudantes e o grupo do berlinde e da modalidade desportiva mais desconhecida, das cumplicidades comunicacionais e um desenvolvimento assente em obra à vista, com os seus méritos, sem dúvida, há que reconhecê-lo, mas com os seus dividendos políticos que ainda hoje subsistem à conta da luz que chegou há trinta anos, do fontanário que teve honras de inauguração presidencial, até a um crescendo de outros benefícios que foram cada vez mais "refinados" transformados para a modernidade.
Sem dúvida que o PSD está ligado a este modelo, Alberto João Jardim foi um líder com defeitos e virtudes, mas resolveu muitos problemas, alguns básicos, da forma como achou melhor através de uma governação mais "musculada", que inevitavelmente teve os seus reflexos em muita gente que ficou pelo caminho por ser "trucidada" pela máquina. Muita gente capaz. Como aliás aconteceu ao longo dos tempos e até hoje, mesmo com outros protagonistas que prometeram fazer diferente fazendo igual. E quando se faz igual, mesmo falando diferente, o resultado será igual. Como é.
Para as gerações que não viveram esses tempos ou para quem, tendo vivido esses tempos, sofreu uma espécie de "apagamento" da memória, é preciso dizer que a Madeira sempre mais ou menos assim, como hoje, embora politicamente com algumas variantes que se calhar fazem pensar numa oportunidade diferente. O PSD sempre governou com o mesmo modelo, com a mesma lógica da subsidiodependência que Jardim agora critica, a diferença é que agora há mais, com uma influência direta de cumplicidades "do meio pequeno, onde existem especificidades", como disse Pedro Calado quando chegou à Madeira depois de ser ouvido pelo juiz, em Lisboa, com uma estratégia de empregabilidade pública, criando "apoios com raiz", quer dentro do partido, quer na governação. E para comunicar, fez tudo igual, a diferença é que a influência, agora, é mais abrangente e parece o que não é. Albuquerque, neste particular, foi mais inteligente do que Jardim.
Quanto à liderança da oposição, durante anos circunscrita ao PS, também foi sempre igual. O Partido Socialista, ao longo de muitos anos, foi uma espécie de "afilhado" de Jardim, com líderes que, com todo o respeito, até se conformavam na oposição e alguns ganhavam até mais com isso do que propriamente no poder, parte de uma elite que na sombra ia dando corpo a uma suposta posição contrária à governação. Era preciso um governo, era preciso um partido de oposição, e assim se formava o espectro democrático na Madeira. A UDP e o PCP saíam do "sério" e isso não era visto como normal da Democracia, era subversivo e era assim que grande parte do povo via. O PSD, perante os críticos, os que se expressam diferente ou os "afastados" passava para o "outro lado da rua". Como hoje.
Mas o PS foi cúmplice durante muito tempo. E só fugiu desse registo, curiosamente com Cafôfo, em 2019, numa conjuntura única, como tal irrepetível face à impossibilidade de reunir todos aqueles factores favoráveis. Esteve quase, mas não se ganham eleições com quase. Cafôfo "morreu na praia" e quando tentou "reanimar" já estava longe da "costa". Foi um processo difícil até hoje e nunca mais conseguiu mobilizar eleitorado suficiente para ter alguma esperança, além de ter permitido, com a sua vulnerabilidade, o aparecimento forte do JPP e do CHEGA.
Como se vê, sem uma mudança de estratégia, de modo global, da oposição, sem força do PS e com uma luta de poder vigente para ver quem lidera essa mesma oposição, sem um projeto que mobilize e não privilegie "apetites" de poder, dificilmente haverá projeto alternativo. Não é uma fatalidade, mas até parece, como temos vindo a referir em diversos artigos anteriores.
Só a diferença, clara e objetiva, poderá conduzir a Madeira a um diferente patamar. Ser igual e fazer igual, só pode dar um resultado igual.
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