O voto no CHEGA deixou de ser de protesto, é mesmo de revolta. E institucionalmente é preciso fazer uma leitura política desta nova realidade.
O grande desafio de Luís Montenegro é tentar formar Governo dispensando o CHEGA mas garantindo estabilidade parlamentar. Não será fácil. Formar Governo é fácil, o difícil é ter esse conforto no Parlamento com a oposição do PS e do CHEGA em matérias que são fundamentais para o País e que poderão, num determinado momento, criar problemas de governabilidade com consequências que até podem passar por novas eleições, dependendo do impasse a que chegarmos.
Estas legislativas nacionais de ontem trouxeram um novo enquadramento politico que não é mais do que o reflexo da governação desastrosa dos partidos do chamado arco do poder. A AD ganhou, é verdade, mas é estranho que perante um desgaste do Governo PS, com tanta demissão e suspeitas sobre o primeiro-ministro em investigação não tenha conseguido mais do que uma vitória à rasca. Em condições normais, se a bandeira da mudança fosse convincente, chegava, via e vencia facilmente. Não foi isso que aconteceu. O PS perdeu as eleições, mas não perdeu como se pensava que pudesse perder pelos mesmos motivos que prenunciada uma vitória confortável da AD.
E foi neste quadro que o CHEGA capitalizou o protesto, mais do que isso, deu expressão à revolta de uma parte do eleitorado que nem tem a ver com uma vertente ideológica mas simplesmente um protesto da esquerda à direita. O CHEGA recebeu votos de eleitores do PSD, do PS e até do PCP. Não há um objetivo ideológico nos votantes no CHEGA, mais de um milhão, mas sim um acolhimento dos que estão fartos destas máquinas governativas e partidárias que se governam mais do que governam. E o voto de protesto visa criar problemas aos poderes instalados que ao longo dos anos foram alimentados pelo PSD/CDS e PS, que não têm conseguido assumir posições de alternativa deixando a porta aberta para um terreno com margem de progresso em termos de ocupação. E o CHEGA, melhor dizendo André Ventura, faz isso muito bem. E pode não ficar por aqui, é preciso ter a consciência e a inteligência políticas para ver esta realidade de forma séria e atender ao que está subjacente a este apoio ao CHEGA. O rótulo de racismo e xenofobia pode ser colado a uma minoria, mas já é dificil, mesmo impossível, colar a um milhão de eleitores. É muito para deixar passar, como ontem avisou o líder socialista Pedro Nuno Santos. Em vez de acusar o CHEGA, é preciso refazer o posicionamento dos partidos tradicionais para que estes ocupem o espaço que "abandonaram" à medida do CHEGA.
A explicação da revolta encaixa nesta subida meteórica do CHEGA. A revolta do povo estaa dar dimensão a um partido que não está dimensionado para suportar os votos que tem. Mas é precido não desvalorizar, é preciso dar mérito a André Ventura, que tem um discurso fácil de captar atenções. Não há um português que não queira combater a corrupção, o compadrio, não há um português que não queira a defesa das forças de segurança, não há um português que não queira disciplinar a imigração no sentido da integração sem comportamentos xenófobos. E o CHEGA fala fácil e torna ainda mais fácil captar votos em ambientes de crise e de casos em cima de casos que fragilizam os governantes. O povo está farto e anda a dizer isso através do CHEGA.
O voto no CHEGA deixou de ser de protesto, é mesmo de revolta. E institucionalmente é preciso fazer uma leitura política desta nova realidade.
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